domingo, 23 de junho de 2013

Agradecimento.

Sabe, na verdade eu sempre fui muito egoísta. Eu achava que gostar de alguém me dava o direito de querer possuir aquela pessoa, e o fato de querer torna-la apenas minha me fazia acreditar que aquilo era amor. Talvez essa confusão ocorra com muitas outras pessoas, não sei. Porém, essa minha visão egocêntrica ficou para trás a partir do momento em que o conheci.
Foi um encontro rápido, de menos de quatro horas, mas aquele pequeno período de tempo contou mais do que anos de convivência com outros. Você já sentiu isso? Quero dizer, pode parecer clichê, mas você já sentiu que conhecia alguém na primeira conversa que teve com essa pessoa? Como de épocas diferentes, vidas passadas... essas coisas?
Pois é, eu senti com ele. Todavia, no mesmo tempo em que eu sentia que podia me abrir completamente eu não conseguia agir de forma natural em alguns instantes, pois algo dentro de mim não parava de repetir “É ele, é ele!”, e isso me desestabilizava, me deixava sem ação. Começava a nascer ali um sentimento que eu nunca tivera vivenciado, que eu nunca tivera contato antes.
Eu não havia percebido, mas eu estava começando a sentir o que as pessoas chamavam de amor.
Por que eu digo isso com tanta certeza agora? Por que não acho que estou me enganando outra vez?
É simples. O amor é simples.
Sim, eu gostaria de tê-lo aqui comigo todas as noites em minha cama para dormirmos e acordarmos juntos, mas eu sei que no fundo ele não pertence a mim, não enquanto ele não quiser pertencer. Eu sei, agora, que amar não é querer ser o domador, mas sim, ser domado. É desejar a felicidade do outro ele estando ou não comigo, mas presando também pela minha própria felicidade.
É compreender que amar é bom, gostoso, que tal ato me faz sentir uma pessoa melhor, mais madura e ponto. É compreender que não dependo de poder chamar quem eu amo de namorado, mas saber que eu amo, saber que para mim existe alguém tão especial que eu faria loucuras por ele sem esperar nada em troca.
É essa sensação de carinho, preocupação, proteção que importa no fim das contas. E eu sou grato, muito grato a ele por isso. Pois eu pude ter nessa vida algo tão belo e puro que deu mais significado para ela apenas pela sua existência.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Outono

Uma, duas estão caindo.

Eram quentes... aquelas mãos que acariciavam meu rosto eram quentes e únicas.
E eram minhas, apenas minhas. Estavam ali para me cuidar, estavam ali para me mimar, estavam ali para empunhar a espada quando eu já não tinha mais forças para me defender sozinho... Estavam ali para segurar as minhas mãos.
... Não estão mais aqui.
Não posso sentir. Estão longe. Estão dando atenção para outros rostos, outras mãos, outros corpos.

Três, quatro estão caindo.

Aqueles olhos refletiam a vitória. Aqueles olhos nos refletiam.
 O seu olhar era o meu esconderijo, meu porto seguro. Você era a medusa e eu... eu era o bobo petrificado que perdia todas as forças quando me encarava da forma mais apaixonante que ninguém havia me encarado antes.
Entretanto, Perseu apareceu e eu não notei que a Medusa morrera e o efeito de seus poderes persistiu em mim.
Aqueles olhos refletem a vitória... apenas a vitória, e para isso, não há espaço para o bobo.

Cinco, seis estão caindo.

Eu era envolto pelos teus braços... sim... todas as noites você me abraçava e eu realmente me sentia amado, realmente acreditava que, assim como dizia, estava feliz de eu estar ali contigo.
Acreditava que mesmo sendo tão diferentes, mesmo tendo ideias tão opostas, mesmo que não planejássemos o futuro... haveria sim um para nós.
Mas não houve. E o passado... Ah o passado, devora-me com suas gigantes presas.

Sete, oito, nove, dez...

Todas as folhas que embelezavam aquela árvore estão caindo.

Dez, onze, doze...

Todas as folhas caíram, exceto uma.
Aquela única e pequena folha continua lá, firme e forte.
Não tem vento, não tem chuva, nem ao menos intervenção antrópica que a arranque.
Aquela folha...
Por quê? Por que ela insiste em não tocar o chão assim como as outras?
Qual a razão de ela lutar tanto e não ceder?
Bem.
Eu acho... não, tenho certeza, que a obstinação dela é porque ainda está aprendendo a como dizer adeus aos tempos quentes do verão, dizer adeus àquela época em que tudo era tão vivo.
Aquela pobre folha precisa aprender a se despedir para que o ciclo das estações prossiga.

domingo, 9 de junho de 2013

O pior paciente


"Foi seu último pedido, queria passear na chuva mais uma vez ao lado de alguém. Eu não pude recusar, não queria recusar. Havia me afeiçoado tanto a ele que simplesmente dizer não seria muito difícil.
Eu o carregava em minhas costas, as gotas caindo violentamente em nós, mas a verdade era que nossos corpos estavam de alguma forma quentes. A chuva simplesmente parecia evaporar ao nos tocar.
Talvez os sentimentos que ambos nutríamos fosse algo proibido, afinal, ele era meu paciente, acabava de completar seus dezoito anos enquanto eu estava nos trinta. Durante todo o tratamento nunca exercemos um papel além da relação médico-paciente, entretanto, nossos olhos nos entregavam, dizendo tudo o que não podíamos dizer com a boca.
Senti que ele abraçava meu pescoço com cada vez menos força. Não dizíamos qualquer palavra, não era necessário. Apenas queríamos estar ali, juntos, sendo molhados pelo céu.
Então, ele aproximou seus lábios no meu ouvido, onde eu escutei sua respiração cada vez mais fraca, e com o que lhe restava disse-me:
- Sabe, é engraçado que justo no momento da minha morte, foi quando me senti mais vivo. Obrigado.
Tudo havia parado. A chuva, os barulhos, meus passos... sua vida. Sem saber se ele estava me escutando, eu respondi:
- Idiota, e como eu vou viver daqui pra frente?
Ele sabia da minha dúvida, por isso quis morrer perto de mim. Até o fim me enfrentou, até o fim me provocou, até o fim foi o meu pior paciente."

domingo, 2 de junho de 2013

O Sobretudo.

Provavelmente em algum momento de sua vida, em algum dia qualquer, você já deve ter passado na frente da vitrine de uma loja, olhado para as peças ali expostas e subitamente começado a escutar uma delas chamando teu nome, sedutoramente, assim como as sereias sensualizavam com os marinheiros. Tal como estas, às vezes essas roupas nos levam para uma armadilha, neste caso não a morte, mas a mais e mais contas que normalmente deixamos acumular e não conseguimos lidar (o que, no fundo, não deixa de ser tão cruel quanto o assassinato).

No meu caso não digo que foi através da vitrine de uma loja que me apaixonei por uma determinada vestimenta, mas durante quatro anos sonhei em ter um sobretudo. Sim, daqueles estilo Matrix sabe?... Aaaah! Eu ia me sentir tão legal usando um daqueles. Poderoso, estiloso, talvez até mais confiante. Enfim, comecei então a ficar implorando para minha mãe por um e isso se prolongou por quatro anos, até eu mesmo passar a esquecer essa vontade por um tempo, não dando tanta importância.

Até que finalmente, na última visita que minha mãe fez, ela decidiu comprar o tão sonhado sobretudo.

Depois de anos esperando, eu ia poder usá-lo! Nunca fui tão animado para uma loja fazer compras.

Logo chegamos e lá estava ele, parado, sussurrando meu nome. Uma paixão, um casal apaixonado que aguardou quatro anos para poder ficar juntos. Porém, enfim, poderíamos concretizar isso.

Nunca me frustrei tanto ao vestir alguma coisa.

Estranho, é, essa palavra pode definir muito bem como fiquei ao usar aquele sobretudo (segundo meus amigos “linguiça com pernas” seria a melhor definição, mas, bem, prefiro não me definir de tal forma, isso pioraria ainda mais a decepção que tive).

Mas ao olhar o espelho, tudo a minha volta pareceu parar, como se o tempo congelasse, exceto a minha mente que começou a trabalhar certa teoria em cima daquela ocasião.

Acabo de sair de um relacionamento e também largar o meu curso da faculdade. Confesso que por mais que eu amasse meu ex-namorado, ele não me “servia”, éramos totalmente opostos, e aquela história de que os opostos se atraem... sinceramente, deve haver um limite para tudo, até mesmo para as diferenças.

Todavia por amá-lo tanto eu não queria admitir que não combinávamos, que o conjunto de “peças” não se encaixava muito bem. E então, continuei usando aquele relacionamento tão fora de moda.

O mesmo serve para o curso que eu fazia. Eu gostava dele, mesmo, mas, assim como o sobretudo, não realçava minhas qualidades.

E pensando bem, não é assim que nossas escolhas funcionam? Quero dizer, tomamos decisões achando que são as melhores, as corretas, únicas e irredutíveis e quando a vida nos dá uma verdadeira pancada na cabeça e somos obrigados a encarar que nem sempre as coisas ocorrem como planejado ficamos sem chão.

Pois é, parece que nós não estamos completamente preparados para situações como essa onde perdemos o controle de tudo. E não, não sou diferente disso. Quando meu ex terminou comigo também senti um vazio, e a pergunta “o que vou fazer agora” era a que mais surgia em minha cabeça. Talvez meu erro foi ter depositado TUDO naquele relacionamento, naquele vínculo, e deixado praticamente nada como uma “vida reserva”, um plano B.

Tal como o sobretudo que tanto sonhei em ter, nossas decisões, nossas escolhas nem sempre servem ou combinam conosco, em algum instante vamos ser obrigados a entender que fomos por caminhos errados, mas isso não quer dizer que seja algo ruim, pelo contrário, faz com que possamos conhecer a nós mesmos e o que nos completa de verdade, o que nos melhora.

Não um relacionamento onde apenas um lado faz força para que dê certo, não um curso que não é o que você realmente quer, nem uma roupa que não te faz sentir bem com teu corpo, mas o oposto de tudo isso.

Afinal, já que não pude levar o sobretudo, fiquei com um blazer liiiiindo o qual só me fez receber elogios.